Na última semana, em uma leitura de bordo – e eu estive muito a bordo a semana toda (risos) –, vi um artigo muito interessante na Revista Restaurant Bussiness, do jornalista especializado e Editor Chefe, Jonathan Maze, sobre os possíveis impactos de uma recessão global no food service, especificamente no hábito de consumo das pessoas que se alimentam fora de casa.
O autor avalia o cenário norte-americano e se vale do contexto da pós-pandemia para projetar uma realidade global. Ele lembra, assim, que muitas famílias estão “queimando” a poupança que fizeram para suportar os novos custos de vida. Por isso, hoje, com as reservas se exaurindo, precisam focar o orçamento doméstico naquilo que é essencial à sobrevivência.
Se precisam focar o essencial, você já pode imaginar quais despesas foram cortadas da planilha mensal. Se o primeiro item que lhe veio à cabeça foi o consumo em bares, restaurantes e similares, obrigado, você está atento ao objetivo deste artigo.
Eu pouco escrevo sobre o consumidor final do food service aqui neste espaço, já que minha especialidade é desenvolver, implantar e levar soluções da indústria de alimentos para os distribuidores, e destes para a cozinha dos transformadores. Mas as informações trazidas pelo jornalista norte-americano me chamaram atenção a ponto de traduzi-las, não apenas do inglês para o português (risos), mas do food service dos EUA para a realidade brasileira.
E o Brasil?
Quando traduzo essa desaceleração dos gastos do consumidor norte-americano para o nosso cenário, vejo com preocupação um possível impacto na nossa cadeia do food service (indústria > distribuidor/atacadista/cash&carry > operador) se por aqui também tivermos que seguir nessa direção. Ou seja, como os gastos com alimentação fora de casa do brasileiro estão anotados, hoje, na planilha do orçamento mensal? Serão excluídos, reduzidos, migrados para outros formatos e faixas de preços?
É parte da nossa cultura, felizmente ou infelizmente, a capacidade de sobreviver a crises, sejam locais ou globais, sem falar na instabilidade econômica quase endêmica e no histórico de inflação. Resumindo: crise no Brasil é quase regra, e não exceção. E a Covid-19, que juntou crise sanitária com crise econômica, provou essa resiliência. Superamos o lockdown e o desemprego. Endividados, com reservas queimadas…mas superamos!
Ainda voltando ao texto da Restaurant Bussiness, vejo lá que “os consumidores norte-americanos continuaram a gastar em restaurantes, apesar da crescente disparidade entre seu poder aquisitivo e o aumento obrigatório ao qual a inflação submeteu os preços dos menus”. Porém, como atesta o próprio jornalista, e reforçando o que endossei acima, essa realidade estava com os dias contados. Não tinha mesmo como durar, certo?!
Por isso, assim que fechei a revista e desci do avião passei a observar com mais cuidado a sinalização dessa realidade no dia a dia dos nossos restaurantes. E bateu uma preocupação. Vi, por exemplo, algumas casas do modelo self-service com uma elevação significativa de preços.
E esse tipo de restaurante é o mais utilizado pelos trabalhadores no horário de almoço, ou seja, o cliente paga a refeição quase sempre com o vale-refeição fornecido pela empresa. Imagine, então, os restaurantes focados em jantares e em outros momentos de consumo!
Imediatamente, me veio a equação:
- consumidor com orçamento curto e poucas reservas
+ endividamento pós-pandemia
+ vale-refeição insuficiente
+ restaurantes repassando para o cardápio a pressão inflacionária global
= ???
Isso não é bom, não pode ser bom. Se fosse algo conjuntural, local, resultado da transição de equipe econômica com a mudança de governo, por exemplo, ainda poderia haver indicadores para uma solução também local ou pontual.
Mas o que vem por aí, não quero assustar nem afirmar, parece algo sistêmico. Arrisco a dizer que está se desenhando uma nova realidade para o consumo de refeições fora do lar, porém esse desenho ainda está desfocado e pedindo muita cautela para ser finalizado.
O que vem por aí? Você arrisca uma projeção? Comente aqui comigo!
JEAN PONTARA é um dos maiores especialistas em Vendas ao Food Service de todo o Brasil. Há 18 anos, ele tem criado estratégias, implantado projetos e formado equipes para Distribuidores, Atacadistas, Indústrias, Cash&Carry, Fabricantes de Equipamentos, Empresas de Tecnologia e Fundos de Investimentos, com uma experiência ímpar na área.